O Governo do Rio começa a traçar planos alternativos para angariar recursos que serão usados para o pagamento da folha salarial dos servidores nos próximos 60 dias.
Entre as principais medidas propostas pelo secretário da Casa Civil e Desenvolvimento Econômico, Christino Áureo, está a antecipação de um ano de pagamento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) dos maiores contribuintes do estado. Em troca, seria concedida uma bonificação futura.
Para a professora de Controladoria e Administração Financeira da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Claudia Vasconcelos Silva, o governo só poderia cobrar o ICMS antecipado das empresas enquadradas na substituição tributária. Nesse regime fiscal, as empresas pagam o imposto devido antes da venda do produto.
"O governo argumenta que está antecipando a cobrança do imposto, quando, na verdade, está mudando o fato gerador que é a venda do produto. Isso só pode acontecer na substituição tributária, não em outros regimes. Se as empresas entrarem na justiça contra essa antecipação provavelmente vão ganhar o processo porque o STF entende que isso não pode ser feito, e já tomou decisões favoráveis neste sentido", explica.
A professora argumenta que o estado seria o único beneficiado em detrimento das empresas. "O estado não teria que dar desconto no futuro porque vai propor o adiantamento de um tributo. Já a empresa terá que fazer uma provisão interna porque mesmo sem ter certeza da venda do produto, terá que pagar o imposto", detalha.
Salários
O pedido deve ser enviado ainda esta semana para a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). No entanto, o secretário da Casa Civil não estimou quanto seria arrecadado com a medida. Como justificativa para a proposta, Áureo destaca os sucessivos atrasos e parcelamentos no pagamento de grande parte do funcionalismo público estadual.
"Discutimos com a Alerj e os demais poderes essas ações, porque o servidor não pode continuar recebendo com atraso. Decidimos acelerar algumas medidas para elevação de receita nas quais já vínhamos trabalhando. Assinamos o Termo de Compromisso com o governo federal há mais de 70 dias, as votações do Plano de Recuperação já foram adiadas por várias vezes e o estado não pode parar", ressalta o secretário.
O Plano de Recuperação Fiscal seria votado pela Câmara dos Deputados na semana passada, mas foi "atropelado" pela "Lista de Fachin", com a revelação de nomes de políticos que serão investigados pela Justiça.
A votação deve voltar à pauta do plenário esta semana. Com a aprovação, o Rio obteria empréstimo emergencial de R$ 3,5 bilhões com a União. Nessa transação, a Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) será a garantia - medida que já foi aprovada na Alerj.
O governo depositou, na quinta-feira (14), os salários de fevereiro de 212 mil servidores - cerca de R$ 588 milhões - e o pagamento de março de ativos da Educação e do Degase, além de ativos, inativos e pensionistas da Segurança (R$ 917 milhões). Os servidores têm vencimentos atrasados ou parcelados desde outubro do ano passado.
Outros recursos
Estimada em R$ 66 bilhões, a Dívida Ativa do estado volta à pauta como outra forma de aumentar a arrecadação estadual. De acordo com o secretário Áureo, um edital para securitização da dívida deve ser lançado no início de maio.
Dessa forma, uma empresa adquire os direitos de cobrança dos valores devidos, e antecipa recursos ao governo. Além disso, será criada uma comissão formada pelas secretarias da Casa Civil e Fazenda, Procuradoria Geral do Estado, Tribunal de Justiça e Ministério Público para criar um mutirão de cobrança da Dívida Ativa - medida que já havia sido sugerida pelo próprio Executivo há dois anos.
Também em maio, o governo deve publicar licitação para escolher a instituição que vai administrar as contas bancárias dos servidores, já que o contrato com o Bradesco vai até novembro. A concessão das linhas intermunicipais de ônibus é outro edital que vai gerar recursos para o caixa estadual. Novamente, Áureo não estimou quanto poderia ser arrecadado.
Entre outros recursos que o Rio pode tentar negociar com a União estão os repasses da Lei Kandir, que desonera o ICMS na exportação de alguns produtos e chegam a R$ 50 bilhões. A professora Claudia argumenta que o valor pode até ser usado como argumento político de negociação, mas não resolveria o problema imediato de caixa.
"Com a crise econômica, a arrecadação diminuiu para todos, com déficits em várias áreas, e o governo federal não tem esse dinheiro disponível para repasse. Poderia haver um abatimento da dívida do Rio, mas o estado precisa de recursos imediatos. A forma mais rápida de alavancar o caixa é mesmo se desfazendo de bens como a Cedae", argumenta a professora.
Cientista político e professor da Universidade Veiga de Almeida, Guilherme Carvalido ressalta que a negociação das dívidas entre União e estado não traria bônus político. "O governo federal é o maior credor do estado do Rio e não quer deixar de receber. Evidentemente, a ajuda para o estado faria um equacionamento que não teria nenhum valor político", avalia.